Aprova Brasil aponta os motivos para bom desempenho das 33 escolas selecionadas
Pais com baixa escolaridade, famílias de baixa renda, casas sem livros e escolas com pouca infra-estrutura são fatores que sempre levam a um mau desempenho na escola. A afirmação, tomada como certa para muitos, foi desmontada na manhã desta terça-feira, 19, em Brasília. Pesquisadores do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e o ministro da Educação, Fernando Haddad, revelaram os resultados do Aprova Brasil.
O estudo, resultado de parceria entre o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC) e o Unicef, analisou quais aspectos foram determinantes para que alunos de baixa renda − e que estudam e moram em regiões social e economicamente vulneráveis − conseguissem obter desempenho escolar acima da média na Prova Brasil.
A primeira edição da Prova Brasil, feita em novembro de 2005, serviu de base para o estudo do Unicef. A Prova Brasil foi realizada em escolas públicas de 5.398 municípios de todas as unidades da Federação e avaliou 3.306.378 alunos de 4ª e 8ª série do ensino fundamental, a partir de provas de língua portuguesa (com foco em leitura) e matemática.
Para selecionar as escolas analisadas, além do alto desempenho na Prova Brasil, Inep e Unicef levaram em conta perfis socioeconômicos similares, de baixa renda, das famílias e dos municípios onde moram e estudam os alunos avaliados. Crianças e adolescentes de 33 municípios espalhados por 14 estados e Distrito Federal foram avaliados, assim como as escolas e os demais agentes ligados à educação dos alunos − como diretores, funcionários, pais e membros de conselhos escolares.
“Em cada caso verificamos que foi feito um esforço da comunidade em proveito de alunos e professores. Fica claro que, com ações voltadas para a constituição de uma comunidade mobilizada em torno de interesses da educação, é possível extrair desses casos exemplos que podem repercutir na qualidade da educação básica”, afirmou o ministro Haddad.
Apesar das dificuldades enfrentadas, todas as 33 escolas avaliadas apostaram na força das relações humanas em torno de um projeto pedagógico, que permitiu o uso dos recursos públicos de maneira criativa e inovadora. Nessas escolas, todos os envolvidos na formação dos alunos participam e decidem juntos os rumos da gestão escolar e do ensino na sala de aula.
Três aspectos foram identificados pelos pesquisadores como fundamentais para explicar o protagonismo das escolas em meio a um cenário pouco provável de alto desempenho escolar − o papel do professor, a participação dos alunos e práticas pedagógicas que envolvem projetos ligados à realidade dos alunos.
Para a representante do Unicef no Brasil, Marie-Pierre Poirier, o aspecto mais importante mostrado pela pesquisa foi o desejo e o esforço de professores, diretores e pais de garantir o direito de cada criança em receber educação de qualidade.
Experiências – A consultora do Unicef para educação, Maria de Salete Silva, chefiou a equipe de pesquisadores e relatou algumas boas práticas de ensino observadas por eles. Segundo Salete, cada escola tem um projeto muito particular que não pode ser copiado, mas que pode estimular outras escolas e ações de governo.
Algumas inventaram o projeto Sacola Literária, que estimula o aluno a ler no final de semana e a contar a história lida aos colegas na segunda-feira. Assim, a falta da biblioteca é minimizada, já que os alunos trocam os livros da sacola. Em Sertãozinho (SP), um bolo é usado para ensinar fração e toda a comunidade, envolvida na aprendizagem, sabe o dia da atividade na escola. “Quando a pesquisadora chegou na cidade para avaliar as escolas, o taxista contou logo do bolo”, disse Salete. Na mesma escola, as aulas de literatura incluem apresentações teatrais dos alunos. Em uma delas, os estudantes promoveram um julgamento, com juiz e advogados, para tratar do famoso caso de Capitu, da obra Dom Casmurro, de Machado de Assis.
Em Tocantinópolis (TO), os alunos plantam e colhem na horta escolar e participam do projeto Cinema na Escola.
Outro fator de surpresa para os avaliadores foi a valorização da disciplina na escola. Geralmente apontada como medida coercitiva, a disciplina é vista com bons olhos até pelos alunos, que consideram a escola 'organizada' ao incluir padrões mais rígidos de controle. Numa escola do Guará (DF), por exemplo, se os estudantes chegarem mais de dez minutos atrasados, precisam levar os pais para explicar o ocorrido ao diretor. E em todas as escolas, meninos e meninas disseram aprovar o uso do uniforme porque gostam de ser identificados como parte da escola.
De acordo com Salete, nenhuma escola reconheceu aspectos ligados à infra-estrutura como decisivos para o desenvolvimento de boas práticas educacionais. “É claro que a infra-estrutura é importante, mas é preciso estar atrelada ao projeto pedagógico da escola. Não adianta ter biblioteca se os alunos não se envolverem num projeto com foco na leitura”, explicou Salete. E todos os pesquisados destacaram como essencial a relação professor-aluno, principalmente quando o ato de ensinar e aprender é enriquecido com formas criativas.
Maria Clara Machado
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