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  • Jovenilha, Maria da Luz e Raimunda tomaram a iniciativa de voltar para os bancos escolares, depois de dedicar suas vidas à educação dos filhos (Fotos: Mariana Leal/MEC)Na Goiânia dos tempos de criança da dona de casa Jovenilha Maria Xisto, 60 anos, as crianças eram obrigadas a trabalhar. “Ou ia para a roça ou não comia”, ela conta. Para as meninas, lápis e caderno ficavam ainda mais distantes. “Naquela época era muito triste, a gente não podia estudar, pra não escrever carta pros namorados”, resgata, com o olhar de quem ainda não consegue entender a injustiça.

    A primeira escola que Jovenilha pôde chamar de sua foi o Centro Educacional 2 do Cruzeiro Novo, em Brasília. Por iniciativa própria, “sozinha mesmo”, como frisou, um dia ela decidiu entrar no colégio por onde sempre passava, e se matricular. Chegou apenas assinando o nome, lendo “nada, nada”, e saiu aluna da turma inicial do primeiro segmento da Educação de Jovens e Adultos (EJA).

    Na noite da última quinta-feira, 3, na primeira semana do ano letivo de 2016 na rede pública do DF, Jovenilha mostrava, orgulhosa, o caderno que abrigou as primeiras lições de caligrafia e que vai seguir dando espaço aos desafios da segunda série. “Já estou aprendendo, já passei de ano. Está difícil, mas eu vou conseguir”, diz a mulher que, depois de ter sua força testada na criação solitária dos dois filhos, precisou superar a idade para realizar o grande sonho da vida: estudar.

    Sonho assumido por Maria da Luz Melo de Menezes, 74, poucos meses atrás. Viúva, mãe de cinco filhos “criados e casados”, ela se viu sozinha em casa, após uma vida inteira dedicada a cuidar da família. Uma vida em que não sobrava tempo nem disposição para retomar a educação formal interrompida com o casamento, que veio cedo. “Há 62 anos eu não estudava. Então eu pensei assim: ‘acho que tá na hora de estudar um pouco pra me relembrar. Se é de estar deitada, assistindo novela... não, vou estudar’. Aí me deu aquela vontade muito, muito grande”, conta Maria da Luz, alagoana de Santana do Ipanema que vive em Brasília há 54 anos.

    Raimunda, 60: a sensação de que agora vai poder ajudar as pessoasRaimunda Rodrigues de Morais, 60, se inspira na filha, Fernanda, para ser mais uma da família a “tomar o caminho da Universidade de Brasília”. Outra que casou cedo e teve de se dedicar a ser somente dona de casa e mãe, ela precisou parar os estudos na quinta série. Ficou com o pouco que sabia, o suficiente para o marido, e não realizou o sonho de ser advogada “para ajudar os outros”.

    “É muito importante a mulher ter estudo, sempre pensei nisso. Não pude ensinar os meus filhos. Foi muito ruim pra mim, não gosto nem de lembrar, porque queria ensinar os meus filhos e eu não podia”, recorda-se a mulher alegre que só se entristece quando lembra da falta que a educação lhe fez. Hoje na terceira série do primeiro segmento da EJA, ela é colega de turma da animada Maria da Luz e, vizinha de Jovenilha, adora fazer as lições de casa junto com a amiga.

    Jovenilha, 60: o sabor da liberdade ao ler as placas nas ruasSessenta – Jovenilha, Maria da Luz e Raimunda são três das milhares de brasileiras com 60 anos ou mais que têm (re)descoberto a escola – e, às vezes, a própria vida – por meio da Educação de Jovens e Adultos. Das 92.392 pessoas dessa faixa etária que voltaram a ser inseridas na educação básica pela EJA, mais de 57 mil são mulheres, segundo o Censo Escolar de 2014.

    Uma maioria que, de acordo com Marcos Maia Antunes, coordenador geral da EJA no Ministério da Educação, não se repete entre as faixas etárias mais baixas que essa modalidade de ensino engloba (a partir dos 15 anos). E que revela, entre outras coisas, um problema herdado de décadas passadas, quando “os sistemas ou redes de educação eram outros e a abrangência era menor”. Ele lembra que se hoje há a quase totalidade de pessoas de 7 a 14 anos estudando, tempos atrás o cenário diferia muito.

    A professora Cláudia Pereira Vianna, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), confirma o problema com os dados do Censo de 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que aponta um crescente número de mulheres não instruídas ou com instrução incompleta quanto maior é a faixa etária. Tendência contrária no caso dos homens.

    “Você tem políticas públicas de educação que vêm focando na igualdade, na equidade, e elas são recentes. Portanto, não é à toa que, quanto mais baixa a faixa etária, mais sujeitos dessas políticas públicas essas meninas são. E o contrário também é verdadeiro”, analisa a pesquisadora de políticas públicas da educação.

    Assim se dá o diálogo entre o número de alunas com 60 ou mais na EJA e o estudo Estatísticas de gênero: uma análise dos resultados do censo demográfico 2010, do IBGE, publicado em 2014. A pesquisa anuncia maioria de analfabetos com 60 anos ou mais entre as mulheres (27,4%, enquanto o índice é de pouco mais de 24% na população masculina dessa faixa etária).

    Escolarização – Entre os fatores que explicam esse contingente de mulheres analfabetas, ou acima de 60 anos que ainda não completaram a educação básica, Cláudia Vianna aponta três problemas. O fato dessas mulheres ainda trabalharem ou se disporem a ficar em casa com os netos para garantir que as filhas trabalhem, o que lhes toma tempo, é o primeiro. O segundo, diz ela, está no chamado “preconceito de ciclo de vida”, o olhar torto com que muitos idosos têm de lidar quando voltam a estudar, e que se torna ainda mais forte relacionado ao gênero feminino.

     “O modelo patriarcal vem restringindo o acesso da mulher à escolarização há mais de um século. E ele persiste. Apesar de todos os avanços de algumas políticas públicas educacionais, ainda tem pedras no caminho”, explica a professora.

    O sexismo, ou a exclusão de gênero, é outro obstáculo, conforme a pesquisadora. Ainda hoje, muitas mulheres continuam sendo impedidas de estudar por seus maridos. Nesse contexto, a EJA ganha ainda mais importância por ser uma segunda oportunidade que, aliada a outras políticas públicas, pode significar a garantia plena do direito dessas mulheres à educação. “No melhor dos mundos, que bom seria se ela não precisasse existir”, comenta Vianna.

    Maria da Luz, 74, sente mais vitalidade e está mais feliz Conquistas – Professora da EJA há 15 anos, Ilma Gláucia Reis Fortunato sabe o quanto a modalidade ainda é necessária e importante, inclusive para quem está ali para ensinar. “É um estímulo pra gente, como mulher, incentivá-las a abrir caminhos. Porque pela educação elas estão abrindo portas”, reflete.

    Para quem retornou à escola após tanto tempo e tantas dificuldades, o sabor é de conquista. A cada letra desenhada com esmero, a cada soma acertada, em cada dia em que o compromisso da noite é estudar. Jovenilha, que antes se sentia cega pela rua, sem conseguir ler o que diziam as placas, hoje experimenta o sabor da liberdade. Maria da Luz é só felicidade e vitalidade depois das aulas. Raimunda tem certeza de que, agora, concluindo os estudos para fazer enfermagem ou direito, poderá ajudar as pessoas.

     Assessoria de Comunicação Social

    Ouça:

  • Tida como a primeira mulher alfabetizada em terras brasileiras, Madalena Caramuru, com data de nascimento incerta, teve seu letramento atribuído ao marido, o português Alfonso Rodrigues, com quem se casou em 1534. O papel de seu pai, o colonizador Diogo Alvarez Correia, foi fundamental no aprendizado da filha. Contudo, o que ela fez com o conhecimento adquirido é que fez a diferença. A indígena se dedicou à luta pelo fim das crueldades praticadas na então Colônia, especialmente, contra as crianças negras escravas.

    Carta de Madalena, datada de 1561, endereçada ao bispo de Salvador, tentava interceder por essas crianças que, em suas palavras, “se veem separadas dos pais cativos, sem conhecer Deus, sem falar a nossa língua e reduzidas a esqueletos”. Embora não tenha sido atendida em seu clamor ao clérigo, ela conseguiu salvar a vida das crianças que conseguiu comprar dos traficantes escravagistas.

    Séculos mais tarde, Nísia Floresta veio para se tornar um marco na vida de meninas e mulheres brasileiras. Nascida no Rio Grande do Norte, publicou uma série de artigos no jornal Espelho das Brasileiras sobre a condição das mulheres. No ano seguinte, publica o seu primeiro livro: Direito das mulheres e injustiça dos homens. Em 1938, ela chega ao Rio de Janeiro.

    Foi nesse ano que fundou o Colégio Augusto, instituição revolucionária para a época, quando o ensino voltado para as meninas era composto pelo que era considerado necessário saber para casar e ter filhos. Na escola de Nísia, elas tinham acesso a conhecimentos de ciências, geografia, história, línguas, artes, literatura, religião e educação física. Apesar das inúmeras e contumazes críticas, Nísia seguiu no caminho do conhecimento e da igualdade para as mulheres até o final de sua vida, em 1885.

    Superação - Dorina de Gouvêa Nowill (1919-2009) perdeu a visão aos 17 anos. Mais de 70 anos de convivência com a cegueira, no entanto, não serviram de obstáculo para o protagonismo da professora na educação brasileira. Primeira aluna cega a frequentar um curso regular na Escola Normal Caetano de Campos, no centro de São Paulo, posteriormente Dorina se especializou em educação de cegos na Universidade de Columbia, em Nova York. Em 1946, criou a Fundação para o Livro do Cego no Brasil e, em 1948, fundou a primeira imprensa braile em grande escala do país.

    No Ministério da Educação, Dorina atuou por mais de uma década. De 1961 a 1973, dirigiu a Campanha Nacional de Educação de Cegos – época em que foram criados os serviços de educação de cegos em todo o território nacional. Dorina se destacou, ainda, na luta pela abertura de vagas para pessoas com deficiência visual no mercado de trabalho.

    Luta - Considerada uma das maiores líderes políticas na luta pelo direito das mulheres, Bertha Lutz, nascida em São Paulo, em 1894, se empenhou na luta pela aprovação da Lei que garantiu o direito de as mulheres votarem e serem votadas. Formada em biologia pela Universidade de Sorbonne, na França, voltou ao país e, em 1919, criou a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher, que viria se tornar a Federação Brasileiro pelo Progresso Feminino (FBPF).

    Foi Bertha quem organizou o primeiro congresso feminista do país e foi discutir os problemas do mundo do trabalho para as mulheres na Organização Internacional do Trabalho (OIT). Também foi a responsável por fundar a União Universitária Feminina, a Liga Eleitoral Independente, a União Profissional Feminina e a União das Funcionárias Públicas.

    Tornou-se deputada na Câmara Federal em 1936, após a morte do titular do cargo, Cândido Pessoa. No cargo, atuou na luta por melhores condições de trabalho, especialmente, para mulheres e jovens. Defendia a igualdade salarial, licença-maternidade de três meses e redução da jornada de trabalho que, na época, era de 13 horas diárias.

    Campeã - Débora Seabra é outro destaque da educação brasileira. Formada em magistério na Escola Estadual Professor Luis Antônio, em Natal, foi a primeira professora com Síndrome de Down do Brasil. Desde 2004, trabalha como professora assistente em turmas de educação infantil e primeiro ano do ensino fundamental e hoje, além das aulas, dá palestras em vários países e já lançou um livro de fábulas infantis. Quando ela nasceu, em 1981, pouco se sabia no Brasil sobre a trissomia do cromossomo 21, ou Síndrome de Down. Mesmo assim, seus pais sempre fizeram questão de que ela estudasse em instituições de ensino regular.

    Sustentabilidade – Um trabalho que transforma diretamente a vida de 600 jovens e crianças deu notoriedade a outra mulher educadora. O projeto de Débora Garofalo, de 39 anos, que atua na Escola Municipal Almirante Ary Parreiras, na periferia de São Paulo, vem mudando até mesmo a relação dos estudantes com a comunidade em que vivem.

    Atenta e motivada a encontrar algo que pudesse melhorar a vida dos estudantes, Débora apostou no ensino da programação, aliado a atividades sustentáveis. Daí nasceu o projeto Robótica com Sucata, cujo objetivo é envolver as crianças em ações de pertencimento por meio do uso da tecnologia para alavancar a aprendizagem. A iniciativa de Débora Garofalo ganhou, no ano passado, o Prêmio Professores do Brasil, do MEC, e agora é finalista do Global Teacher Prize – prêmio internacional considerado o nobel da educação.

    Mais mulheres – Outras mulheres que exercem papel fundamental nas escolas brasileiras são as merendeiras. Dados do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), indicam que mais de 100 mil delas trabalham em160 mil escolas e são diretamente responsáveis pela preparação das refeições de 45 milhões de estudantes em todo o país.

    Para valorizar o trabalho das merendeiras, a TV Escola promoveu, em 2018, o reality show Super Merendeiras. A ganhadora foi a merendeira Dejanira de Souza da Escola Municipal Nossa Senhora Das Candeias da Ilha da Maré, Bahia. A receita campeã foi abará de carne moída com aipim.

    Pesquisas comprovam que, no ambiente escolar, mulheres são maioria. Segundo o Censo Escolar 2018, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), no Brasil são mais de 1,7 milhão de professoras. Dados mais recentes do Censo da Educação Superior, referentes a 2017, também mostram a predominância das mulheres na educação superior. Elas são 55% dos estudantes ingressantes, 57% dos matriculados e 61% dos concluintes dos cursos de graduação. Na licenciatura, por exemplo, 70,6% das matrículas são do sexo feminino.

    Assessoria de Comunicação Social 

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