Meu filho estudou numa escola pública da periferia de Salvador. E se deu bem
Toda sexta-feira de manhã, Clotilde Santana tem encontro marcado com 50 crianças do coro da escola do bairro onde mora, na periferia de Salvador (BA). Ela é dona de casa e resolveu doar tempo e dedicação aos alunos da escola municipal Primeiro de Maio, onde estuda seu filho Silas, de 9 anos. Além de ensinar as crianças a soltar a voz, a mãe e professora voluntária também encontra tempo para participar da vida financeira da escola. Ela é tesoureira do Conselho Escolar.
“Sou professora de música voluntária porque eu gosto e não me custa nada ajudar a escola onde meu filho estuda”, diz a mãe professora. Ela insiste que a participação dos pais é fundamental para que o filho tenha um bom rendimento na escola.
Professora da 3ª série, Rosalinde Silva de Almeida também é mãe e assegura que os alunos com pior rendimento são justamente os que não encontram ajuda em casa. “Meu filho tem um ano e quatro meses e, em todos os momentos em que eu percebo que ele está interessado, eu procuro estimular, mostrando que existe diferença entre números e letras, entre desenhos e letras.” A professora acredita que a proximidade da escola com a casa da criança facilita o relaciotitle_aliasnto dos pais com a escola. “Hoje vieram duas mães saber do comportamento dos filhos. E eu sempre mando recado quando a criança não está fazendo o exercício, mando chamar a mãe. Quando encontro pelo caminho, eu sempre converso. A gente se encontra sempre, a gente mora perto e está sempre se vendo”, reforça.
A diretora da Primeiro de Maio, Simone de Jesus, concorda que os pais têm papel importante na educação, e sempre busca a participação da família. “Fiz uma reunião recentemente com os pais porque a turma da 2ª série está com problemas de disciplina. Disse aos pais que eles precisam ter a consciência de que a escola sozinha não caminha. A escola só é de qualidade se o pai tiver a idéia de que a escola é boa para o filho dele. Assim ele vai zelar pela escola e dar exemplo para esse menino zelar também”, aconselha Simone.
Simone admite que nem todos os pais têm interesse em acompanhar a vida escolar do filho, mas considera satisfatória a parceria que a sua escola conseguiu desenvolver. “Temos muitos pais parceiros da escola na educação, do dever de casa às coisas simples, como ensinar a lavar as mãos, ensinar que é errado andar descalço onde alaga, perto da maré, que não pode pegar o peixe da maré, porque está poluída, suja. Nós temos essa parceria aqui, não é 100%, mas isso seria utopia”, diz.
Pai de Robert, David, Marcley e Taliany, Joel Santos estudou na escola que hoje ensina seus filhos, e se emociona ao falar da instituição. “Hoje, o Robert, meu filho mais velho, é um dos grandes alunos de outra escola. Ele está na 8ª série, e quando perguntam onde estudou, ele fala: na Primeiro de Maio” relata o pai, com olhos úmidos.
“Os professores procuram saber dos alunos, procuram os pais, chamam os pais, conversam, explicam, chamam a família até a escola e formam um conjunto que só faz a escola ganhar. A gente até perde as palavras, mas, em termos de ensino, é muito importante. É maravilhoso. Meus filhos são muito inteligentes”, completa Joel.
Para ele, a comunidade preserva a escola porque a percebe como um lugar que pode dar um futuro mais promissor aos filhos. Desde 1983 no bairro, a instituição já acolheu muitos alunos que hoje são pais ou voluntários da escola, como Mateus Moreno, de 21 anos. Hoje, o ex-aluno dá aula de artes, e até arranjou um colega para ensinar durante o período em que ele está no trabalho.
A mãe Clotilde não dá espaço para as dificuldades e prefere lutar pelo sucesso do filho. “Pobreza não é sinônimo de falta de educação, de porcaria. Minha mãe me criou lavando roupa para fora e eu não virei assaltante, ou algo do tipo. Pelo contrário, ela me formou com dificuldade e eu hoje faço isso com meu filho.”
Maria Clara Machado