A união é o destaque de escola em Cuiabá
Distrito de Nossa Senhora da Guia (MT) — No interior de Mato Grosso, a 26 quilômetros da capital Cuiabá, uma única escola pública oferece os ensinos fundamental e médio a alunos de 15 comunidades rurais. Essencial para garantir o direito de aprender de crianças, adolescentes e adultos, a escola estadual Filogônio Corrêa atende a cerca de 600 alunos matriculados da 3ª série do ensino fundamental à 3ª série do médio, além de oferecer educação de jovens e adultos.
Apesar da falta de estrutura física adequada e dos poucos recursos, a escola é exemplo no estado. A equipe escolar não se deixa abater pelas dificuldades e investe no empenho individual e no esforço coletivo para melhorar o ensino. O resultado é o desempenho escolar acima da média nacional. A nota da escola no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) é 4,0 — a média brasileira é 3,8.
“A escola tem que ser um espelho para a comunidade”, aponta o professor de história Samuel da Silva, há 21 anos lecionando na instituição. Para ele, o exemplo de que é possível superar adversidades precisa vir da escola. Ele reclama, porém, das salas cheias — são quase 40 alunos em cada uma — e da falta de recursos para investir em laboratórios e computadores, mas não se arrepende da profissão que escolheu. ”A compensação é o contato com a comunidade e poder ajudar”, ressalta.
A relação estreita entre pais, alunos e professores ajuda os professores a lidar com as especificidades de cada aluno. Samuel garante que, depois de tanto tempo ensinando à comunidade, conhece a maioria dos moradores da região. Muitos de seus antigos alunos hoje têm filhos na escola.
“A gente vê os alunos crescendo, formando famílias. E ainda lembrando da gente”, orgulha-se a professora da 3ª série, Pastorina da Cruz. Ela visita os alunos com mais dificuldades para tentar resolver junto com os pais o problema de cada um. Pastorina conta que, no ano passado, teve um aluno muito agressivo e com dificuldade para aprender. Ao visitar sua família, percebeu que o menino tinha problemas em casa porque os pais biológicos o haviam abandonado.
“Tentamos ajudar com conversas. A gente acaba fazendo papel de mãe e de psicóloga”, relata a professora. O diálogo ajudou o menino que abandonou o comportamento rebelde e passou a contar com o ombro amigo dos professores.
Sem biblioteca ou livros, a professora improvisa. Junto com os estudantes, abriu espaço na sala apertada para o cantinho da leitura. Lá, eles construíram uma cabaninha, feita de TNT, com material de leitura — livros, revista e gibis — trazidos de casa pelos alunos. “E eu comprei livros bem coloridos, de histórias curtas para despertar a atenção deles”, diz. Pastorina acredita que a iniciativa também serve para ensinar todos a trabalhar juntos.
O vigilante da escola, Nílson Valor, também compartilha da idéia de que compensa assumir muitos papéis. Aqui, além de garantir a segurança das 6 horas da tarde às 6 horas da manhã, ele ajuda a cuidar das crianças na hora do recreio, faz reparos na escola, atividades esportivas nos fins de semana, participa da organização das festas e é responsável pelos ensaios de festas juninas. “Eu faço o papel da moça e do rapaz”, diverte-se.
“Ele também é mecânico, eletricista, encanador, tudo”, acrescenta o coordenador pedagógico José Aparecido de Souza. Na última festa do dia das mães, Nílson escreveu e dirigiu uma peça de teatro sobre o envolvimento de alunos com drogas e prostituição. O atribulado vigilante ainda faz questão de ajudar os alunos a fazer a tradicional formatura no final do ano. “Corro atrás de premiação para fazer rifas. Já consegui uma bicicleta e um DVD”, exemplifica.
O trabalho empenhado é, na opinião, da professora Pastorina, “o mínimo que se pode fazer”. Para ela, o retorno é garantido. “Vale a pena porque você vê a criança progredir e aprender”, destaca.
Maria Clara Machado