Alfabetização e Letramento foi o tema da segunda conferência magna realizada no 2º Fórum Nacional Extraordinário da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) nesta quarta-feira, 24, em Brasília. Telma Ferraz Leal, professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e membro do Centro de Estudos em Educação e Linguagem (Ceel), do Centro de Educação/UFPE, e Elvira Souza Lima, consultora em alfabetização e letramento, fizeram apresentações.
Telma Ferraz Leal diferenciou os conceitos de alfabetização (processo de apropriação do sistema alfabético de escrita) e letramento (conjunto de práticas de uso de diferentes materiais escritos) e afirmou que o sucesso na aprendizagem da língua portuguesa depende do desenvolvimento de ambos. Segundo a professora da UFPE, há diferentes tipos de letramento, como o adulto que compra um jornal para que outra pessoa o leia para ele ou a criança que brinca de ler um livro para alguém: ambos não dominam a escrita, mas se relacionam com ela de alguma forma.
A polêmica sobre o uso dos métodos sintético – parte do ensino da unidade menor (letra, fonema ou sílaba) para o todo; analítico – parte do sentido global da escrita (texto, frase) para unidades menores (palavras, sílabas, letras, fonemas); ou analítico-sintético (combinação dos dois métodos) –, segundo Telma, é uma discussão sem sentido. Para ela, o importante é que as unidades lingüísticas sejam objeto de reflexão na medida em que compõem o texto. O aluno precisa entender que a escrita tem relação com o som em um texto que faça sentido para ele. “Ser alfabetizado não é suficiente, é preciso tempo para consolidar a alfabetização. Para isso, é preciso trabalhar com leitura e escrita”, diz. Os textos devem ter relação com a vida do aluno para evitar estranhamento.
Desempenho – Para Telma Ferraz, a polarização entre metodização ou desmetodização do ensino da língua portuguesa não encontra soluções para o mau desempenho no aprendizado apontado pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb/Inep 2003), segundo o qual 54% dos alunos de 4a série têm desempenho crítico ou muito crítico em leitura. O importante é garantir tempo para o aprendizado da relação entre sons e escrita (consciência fonológica), leitura e produção de texto. A qualidade dos materiais didáticos, da formação inicial do professor e de suas condições de vida e trabalho é fundamental para a qualidade do aprendizado da leitura e escrita.
Para a consultora Elvira Souza Lima, na ampliação atual da alfabetização no Brasil, mais importante do que entender como a criança aprende é explicar o que acontece quando a criança não aprende. “A aquisição de leitura e da escrita está relacionada ao desenvolvimento da capacidade simbólica do ser humano. A escrita é realização relativamente recente na história da humanidade”. Segundo a consultora, leitura e escrita não se desenvolvem naturalmente, como a fala, e envolvem funções diferentes do cérebro. Ao contrário da fala, determinada geneticamente, leitura e escrita se aprendem. As dificuldades se devem, muitas vezes, ao fato de várias aprendizagens sobre o código escrito ficarem fragmentadas, não constituindo redes neuronais na memória.
Memórias – A criança não faz relações entre diferentes conhecimentos que têm sobre a escrita e a leitura e não se alfabetiza. “Algumas memórias são imprescindíveis para desenvolver o conhecimento escolar, outras menos importantes”, diz. O desafio é saber desenvolver, com atividades pedagógicas e culturais, as redes de neurônios do cérebro para que o aluno faça as conexões para ler e escrever. Para Elvira, professores e especialistas têm potencial para fazer isso após conhecer o processo de desenvolvimento da criança. “Como funciona a memória, como ocorre o desenvolvimento da função simbólica, como o cérebro se desenvolve e como o processamento da linguagem ocorre no cérebro”, explica.
A universalização do ensino e da escrita são fatos recentes na história. Se após a universalização da escola o Brasil enfrenta o desafio da universalização da escrita, diz Elvira, é positivo que muitos sistemas de ensino busquem com afinco a solução para as crianças que não aprendem: “O professor e o gestor brasileiros não desistem”, acredita. Mas o grande esforço dos profissionais da educação se ressente da ausência de registro das suas experiências. É fundamental, segundo ela, que os sistemas de ensino estimulem o registro pedagógico das experiências nas escolas, para que os profissionais da educação possam refletir sobre suas práticas e aprimorá-las.
Adriana Maricato