A tradição do cultivo de uvas e vinhos no Rio Grande do Sul, antes passada de pai para filho pelos imigrantes italianos, agora é aprendida na escola. Com 90% da produção de vinhos do país, a região da Serra Gaúcha é a primeira em mão-de-obra especializada, graças, principalmente, ao Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet) de Bento Gonçalves. E o sucesso do curso chegou longe. Em Pernambuco, que desponta como grande produtor de vinhos e derivados, uma escola federal oferece graduação nos mesmos moldes.
Durante os três anos do curso técnico de viticultura e enologia, os estudantes da Serra Gaúcha aprendem a cultivar a uva e a produzir os vinhos riesling itálico, chardonnay, cabernet sauvignon, merlot, sangiovese e tannat, vendidos e apreciados em todo o mundo. Além disso, ao concluir o primeiro curso superior de vitivinicultura do Brasil, o aluno sai capacitado para trabalhar em laboratórios de análises químicas, cantinas de vinificação e em culturas da uva, além de empresas exportadoras e importadoras de vinho, de mudas de videira, de insumos e derivados.
Um dos pilares da economia gaúcha, a produção de vinho abriga grande parte do mercado de trabalho na região da Serra. Carlos Trevisan, professor do Cefet de Bento Gonçalves, salienta que da última turma de formandos, todos foram lançados no mercado. A competitividade, segundo ele, exige o incremento de uma produção de qualidade, que somente será alcançada com a inserção de profissionais cada vez mais capacitados. "As vinícolas da região dispõem de tecnologias comparáveis às dos países desenvolvidos e exigem profissionais com a melhor formação técnica. E aqui nós oferecemos essa capacitação", destacou.
O curso também tem a preocupação de despertar a capacidade empreendedora no aluno. Tanto que, em sua maioria, os proprietários das vinícolas são formados pela escola. Carol Panceri, 18 anos, estudante do terceiro semestre, sofreu a influência dos pais, produtores, na escolha da profissão. "É um setor em expansão e ainda existe a possibilidade de trabalhar em áreas afins, como harmonização e sommelier", disse.
Principal atividade econômica da região, as viniculturas reforçam a importância de os Cefets estarem vinculados às matrizes de produção local. "É por meio de audiências públicas que a comunidade escolhe os cursos que respondem às demandas da produção", explicou o secretário de educação profissional e tecnológica do Ministério da Educação, Eliezer Pacheco.
Cerca de duas mil famílias de agricultores vivem do cultivo de uvas na Serra Gaúcha. Grande parte dos agricultores utiliza mão-de-obra familiar, geralmente formada pelo Cefet. Naquela região existem 650 viniculturas. Cada uma delas deve contar com no mínimo um enólogo. Daí a garantia de empregabilidade do setor.
Uva do Nordeste - Outra região do Brasil que vem se desenvolvendo como grande produtora de vinhos e derivados é a do Vale de São Francisco, em Pernambuco. A exemplo do Cefet de Bento Gonçalves, o de Petrolina prepara e capacita a mão-de-obra local.
Luciano Manfroi, professor responsável pelo curso, destaca que há regiões com clima semelhante ao do Vale do São Francisco na América Central, na África e na Ásia, mas nenhuma delas apresenta a mesma capacidade de produção de vinhos brancos aromáticos, tintos frutados e espumantes. "O calor do clima semi-árido proporciona a colheita de até duas safras e meia por ano", disse. Manfroi lamenta apenas que a região não conte com trabalhadores especializados para atender o mercado, mas salienta que dentro de dois anos a região começará a colher os frutos do aprendizado da primeira turma do curso de viticultura e enologia iniciado no ano passado.
Os estudantes vêem a produção de vinhos como um mercado promissor. Se depender de Kaline Pinheiro e seus 57 colegas de curso, a importação de mão-de-obra está com os dias contados. A pernambucana de 20 anos aposta nos estudos por entender que a região vem se desenvolvendo. "Estudo das 13h às 18h, fora as aulas práticas. No final de 2007, pretendo estar no mercado de trabalho", disse. Empolgada com a oportunidade, a estudante diz que é importante abrir os olhos da comunidade para a implantação do cultivo do vinho na região.
Mercado - O Cefet de Bento Gonçalves produz os vinhos elaborados com matéria-prima da área conhecida como Vale dos Vinhedos, primeira indicação de procedência para vinhos brasileiros. O centro elabora cem mil litros de derivados de uva por ano, seis variedades de vinho, um espumante e um destilado.
Segundo a divisão de enologia da Secretaria da Agricultura do Rio Grande do Sul, o principal município produtor de uvas é Bento Gonçalves, com 91.486 habitantes, conhecido como capital brasileira do vinho. Seguem-se Flores da Cunha, Caxias, Farroupilha e Garibaldi.
Repórter: Sandro Santos