O Ministério da Educação e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) firmaram protocolo de intenções nesta quarta-feira, 12, para intensificar ações de combate ao trabalho escravo no país. Os dois órgãos, em parceria, fizeram o almanaque do alfabetizador Escravo, nem pensar! como parte do projeto de mesmo nome, desenvolvido pela ONG Repórter Brasil. O almanaque está sendo distribuído a 42 mil alfabetizadores dos estados onde há maior incidência de trabalho escravo: Pará, Mato Grosso, Piauí, Bahia, Maranhão e Tocantins.
“O próximo passo será uma pesquisa para saber o impacto do almanaque nestas regiões”, disse o ministro da Educação, Fernando Haddad. Segundo ele, todos os programas do MEC passam por avaliações para “acompanhamento da efetividade das ações, ampliação e focalização”. Segundo Haddad, parcerias se estabelecem para aperfeiçoamento contínuo do ministério.
O protocolo de intenções prevê o estímulo a estudos e pesquisas sobre a educação como instrumento de estratégia e prevenção contra o trabalho escravo, assim como divulgação e disseminação de informações sobre o tema nos fóruns estaduais de educação de jovens e adultos e secretarias municipais e estaduais de educação nos seis estados onde há maior incidência de trabalho escravo.
Conscientização – O almanaque destina-se aos alfabetizadores, que também alertam beneficiários do Brasil Alfabetizado sobre riscos ao darem ouvidos a falsas promessas de trabalho. “São promessas que aprisionam trabalhadores que, geralmente, têm moral elevada e querem honrar dívidas. As promessas os mantêm coagidos com trabalho forçado”, disse o ministro.
Já a diretora do escritório da OIT no Brasil, Laís Abramo, comentou que educação e trabalho têm interfaces evidentes. A OIT calcula 2,3 milhões de trabalhadores escravizados no mundo do tráfico sexual e no trabalho forçado, “onde não só há coerção e privação de direitos, como degradação, atentados aos direitos humanos, crimes além da esfera trabalhista”. Dados da OIT indicam que os aliciados para o trabalho escravo são, na maioria, homens entre 21 e 40 anos, analfabetos ou com pouca instrução.
O secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC, Ricardo Henriques, e a diretora do escritório da OIT no Brasil, formalizaram o protocolo de intenções contra o trabalho escravo na presença de representantes do Ministério do Trabalho e Emprego, da Associação Nacional dos Magistrados, Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, Ministério Público Federal, Embaixada da Alemanha e secretarias estaduais e municipais de educação.
Almanaque – O almanaque conta a história de Julião, trabalhador aliciado para um serviço em uma fazenda e que, mais tarde, foge e denuncia o problema ao sindicato dos trabalhadores rurais. O almanaque fala da trajetória do trabalho escravo no desmatamento de florestas para a produção de pastos e lavouras nas regiões Norte e Centro-Oeste. Informa as precárias condições de alimentação, higiene e hospedagem, a dívida nas cantinas e como o trabalhador deve agir para não cair nas promessas dos aliciadores, além de como e onde denunciar.
O almanaque Escravo, nem pensar! é uma contribuição do MEC para ampliar as informações sobre o problema, esclarecer os trabalhadores e incentivar denúncias. No material, o alfabetizador encontra as entidades e telefones em cada estado onde podem ser feitas denúncias do trabalho escravo; informações sobre onde mais ocorre; sugestões de atividades para a sala de aula; e lista de termos usados nesta relação criminosa de trabalho. ‘Gato’, por exemplo, é aquele que alicia a mão-de-obra para o trabalho nas fazendas, conhecido também como empreiteiro, e ‘doutor da enxada’ é como se chama o peão que usa bem a enxada e rende bastante no trabalho.
De acordo com o almanaque, de 1995 até outubro de 2005, cerca de 17 mil pessoas foram libertadas do trabalho escravo por grupos móveis de fiscalização formados por fiscais do Ministério do Trabalho, Polícia Federal e Ministério Público do Trabalho. Neste período, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) registrou 32 mil denúncias, em 19 estados. O Pará e Mato Grosso são os estados que mais recebem peões que acabam escravizados. Já Maranhão, Piauí e Tocantins são os estados de onde eles mais saem.
O artigo 207 do Código Penal estipula pena de um a três anos e multa para quem alicia trabalhadores, para levá-los de uma para outra localidade do território nacional. O almanaque fala do isolamento geográfico, das ameaças físicas e psicológicas, da retenção de documentos e das dívidas inventadas. A cartilha está em domínio público e pode ser acessada na página eletrônica da OIT.
Susan Faria