Pescadores de Xique-Xique, Barra, Pilão Arcado e Remanso, municípios às margens do Rio São Francisco, na Bahia, deverão testar este ano um modelo de educação de jovens e adultos (EJA) combinado com qualificação profissional e economia solidária. Entre 1.500 e 1.700 pescadores destes municípios concluem este mês o curso de alfabetização Saberes das Águas, oferecido pelo Ministério da Educação e Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca (Seap), em parceria com a Agência Espanhola de Cooperação Internacional (Aeci) e Universidade do Estado da Bahia (Uneb).
Parte do Programa Brasil Alfabetizado do MEC, o Saberes das Águas é um projeto especial para atender colônias de pescadores. O piloto para testar o formato do curso, os conteúdos e a periodicidade das aulas, para atender às características da atividade, teve início em novembro de 2005 durante o defeso (época de reprodução dos peixes) e será concluído este mês.
Segundo o diretor do Departamento de Educação de Jovens e Adultos da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad/MEC), Timothy Ireland, além de avaliar o projeto e certificar os alunos, o MEC e a Seap discutirão com os prefeitos dos quatro municípios as chances da oferta de EJA profissional aos que concluíram a alfabetização. A proposta de um curso de educação de jovens e adultos com qualificação profissional e social visando à auto-sustentabilidade das colônias será apresentada aos prefeitos entre os dias 15 e 18 deste mês por Timothy, pelo secretário executivo da Seap, Dirceu Lopes, e pelo subsecretário de Desenvolvimento da Aqüicultura e Pesca, Karin Bacha.
Visão – Para o coordenador do Projeto Saberes das Águas, Andrez Gray Aznar, que representa a Aeci na parceria, a dificuldade encontrada na alfabetização dos pescadores do Rio São Francisco foi a baixa visão provocada pelo reflexo do sol nas águas. Em pesquisa com 180 pescadores do município de Remanso, inscritos no projeto de alfabetização, Andrez viu que 50% abandonaram as aulas por não conseguirem acompanhar as atividades, nem ler e escrever. Numa avaliação preliminar, esta é a principal causa da evasão constatada no projeto. O longo período de pesca contínua – de duas a três semanas – é outro causador da evasão.
Ele sugere que antes de levar o projeto para outros municípios de área de pesca, os problemas devem ser corrigidos. “Um programa de avaliação da visão e oferta de óculos são essenciais para o sucesso da alfabetização”, diz Andrez. A Uneb, responsável pela formação dos alfabetizadores, relatou o problema da visão como causa principal da baixa aprendizagem e evasão.
Projeto – O Saberes das Águas cadastrou, no segundo semestre de 2005, três mil pescadores para o projeto-piloto. A formação dos alfabetizadores foi feita em novembro e as 145 turmas começaram as aulas em dezembro. A primeira fase do curso (dezembro de 2005 a fevereiro de 2006) foi intensiva para aproveitar o defeso. A segunda foi de março ao início de julho deste ano, com calendários diferenciados feitos pelas colônias, conforme o tempo que os pescadores tinham para freqüentar as aulas.
Segundo o coordenador do projeto na Uneb, João Rocha, os pescadores de Xique-Xique, por exemplo, que ficam até quatro dias, direto, no rio, tiveram aulas aos sábados, domingos e segundas-feiras. Além do calendário, outra diferença do projeto está nos materiais didáticos confeccionados pelo Departamento de Ciências Humanas e Tecnologias da Uneb. A abordagem dos conteúdos leva em conta o cotidiano do pescador: rio, tempo, fases da lua, meio ambiente, confecção de redes, venda dos peixes e o defeso.
Ionice Lorenzoni