Todos os dias, estudantes de escolas da rede federal de educação profissional e tecnológica criam soluções para problemas cotidianos de empresas e pessoas. Enquanto alguns desses inventos não saem do papel, outros se transformam em bons negócios e oportunidades, como o Ministério da Educação mostrou durante a Globaltech, a feira de ciência e tecnologia que ocorreu, de 17 a 22 de maio, em Porto Alegre.
O fatiador de frios que pesa e imprime a etiqueta com dados do produto automaticamente, o sistema de gerenciamento remoto de aparelhos eletro-eletrônicos para casas inteligentes, a cadeira de rodas elétrica de baixo custo, o controlador externo de elevadores e a marcadora de placas de circuito impresso foram as novidades exibidas no estande do MEC, durante o evento.
Filipe Giusti e Bruno de Oliveira, estudantes do curso técnico em Eletrônica do Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas (Cefet-Pelotas), levaram para Porto Alegre, o controlador externo de elevadores e a marcadora de placas de circuito impresso. Enquanto o professor Rafael Galli mostrava o funcionamento de uma cadeira de rodas elétrica criada dentro da mesma escola aos visitantes, o estudante Joseph McComb, do Cefet-Amazonas, preocupado com a questão da segurança e o conforto, exibia um sistema de gerenciamento remoto de aparelhos eletro-eletrônicos utilizando um assistente pessoal digital (palm top). O fatiador três em um foi criado por Edgar Rodrigues do Carmo e Tobias Firmino Soares, ex-estudantes do Cefet-Minas Gerais.
Controle – A cadeira de rodas elétrica, com autonomia para levar uma pessoa de até 80 quilos, a sete quilômetros por hora é comum, não fossem dois detalhes, os sistemas de ponto zero e de corrente. Enquanto o primeiro avisa ao usuário o tempo de carga restante da bateria, o segundo limita a potência do sistema e o protege contra sobrecargas. O professor de Microprocessadores do Cefet-Pelotas, Rafael Galli, assegurou: “Não existe hoje, no mercado, equipamento com tanta tecnologia”.
Ronaldo Schwalm, de 27 anos, gostou da engenhoca. Ele sofreu um acidente há três anos e usa uma cadeira de rodas comum para se locomover. Para ele, o equipamento desenvolvido no Cefet é sensível e preciso. O empresário do setor metalúrgico elogiou o equipamento e fez uma ressalva: ela não tem a mobilidade de uma cadeira normal, que pode ser dobrada e levada no carro. O professor Rafael desfez o engano, ao tirar as duas baterias do equipamento e dobrá-lo. “Desse modo – disse – ele pode ser levado no porta-malas de qualquer veículo, como uma cadeira comum”.
Rafael projetou o equipamento em conjunto com o mecânico Hiraldo Bunde e os engenheiros Danilo Franchine, Carlos Bunde, Márcio dos Santos e Marlon Rabassa Porto. O protótipo ficou em R$ 15 mil, mas a pretensão do professor é colocá-la em uma linha de montagem e tornar seu preço final equivalente ao de um computador, entre R$ 3 mil a R$ 4 mil. Assim, explica, “poderia ser enquadrada em uma linha de crédito já existente no Brasil e ter o preço financiado. Uma cadeira de rodas elétrica, de tecnologia nacional, sai hoje por volta de R$ 5 a R$ 7 mil.
Circuito impresso – O estudante Filipe Giusti montou a marcadora de placas, ou plotter, junto com seu colega Mateus Matias, durante o terceiro módulo do curso de Eletrônica do Cefet-Pelotas. É um dispositivo para traçar gráficos ou desenhos, através de canetas acopladas, combinando instruções de encostar e levantar a caneta com os deslocamentos da folha de papel. Geralmente, quando são poucas as placas a serem produzidas, esses circuitos são desenhados à mão. Para o protótipo, Filipe e Mateus utilizaram três velhas impressoras matriciais que encontraram fora de uso na escola. Delas, retiraram os carros, as correias e os motores. O funcionamento é simples. De posse de um desenho em bitmap (bmp), um processador envia as informações para o circuito, que imprime o desenho na placa de cobre, através de uma porta paralela de computador.
O estudante estima em cerca de R$ 100 o custo de seu produto. No mercado, um similar importado está entre R$ 2 mil e R$ 3 mil.
Daniel Garcia, da GPA Informática, utiliza essas placas para produzir equipamentos eletrônicos em sua empresa, mas não as fabrica. Ao visitar a feira, ele gostou tanto do invento, que ficou de contatar Filipe para estudar a viabilidade de produzir uma marcadora semelhante em sua empresa.
Elevatrô – Bruno de Oliveira levou para a Globaltech o Elevatrô, um controlador de elevadores, com controle externo visual. Por meio de um monitor de computador, ele acompanha toda a movimentação do transporte vertical em edifícios.
É um sistema de segurança, criado em parceria com o colega Guilherme Patzer, que permite enviar o elevador para um determinado andar e paralisá-lo se o peso exceder à carga máxima permitida para o transporte. A porta aberta em um andar ou a paralisação entre um patamar e outro também podem ser monitoradas pelo porteiro do prédio, através do sistema.
Durante a feira em Porto Alegre, Bruno recebeu a visita de dois funcionários de empresas de elevadores interessados em conhecer a tecnologia usada pelo Cefet-Pelotas no equipamento. Em suas companhias, há sistemas semelhantes, porém sem controle visual externo.
3 em 1 – O fatiador de frios automatizado, com balança e impressora térmica chamava a atenção de quem passava pelo estande do Ministério da Educação na Globaltech. Simulando cortar 43 fatias por minuto de bolonhas ou salaminhos, o diferencial da invenção de Edgar Rodrigues do Carmo e Tobias Firmino Soares, do Cefet-Minas Gerais, tem a integração de três equipamentos como diferencial em relação aos concorrentes.
Com a T-300, o nome que Tobias e Edgar deram ao produto, criado em conjunto com seus colegas do curso técnico de Eletrônica Cleber Magalhães Gonçalves e Leandro Marcos de Oliveira, o produto pode ser fatiado por peso, por número de fatias ou mesmo por preço. “Não existe equipamento similar no mercado”, garante Tobias, que teve a idéia depois que herdou uma padaria do pai e se viu às voltas com a melhoria da satisfação de seus clientes e da busca de maior produtividade de seus funcionários.
Feita a seleção desejada, o fatiador pára quando atinge a programação selecionada. Tudo feito automaticamente, inclusive o ajuste da espessura da fatia. É isso que permite conter o desperdício e aumentar a satisfação do consumidor. “Se o cliente quer somente 200 gramas de presunto, não posso cortar 240 gramas, sob pena de perder 20% do produto ou ter que empurrar o excedente a ele”, disse Tobias.
Depois, a balança envia as informações para a impressora térmica, que emite uma etiqueta com todas as informações necessárias sobre a mercadoria, como nome do estabelecimento, peso, quantidade de fatias, preço, data de validade, informação nutricional e código de barras, complementava Edgar.
Casa inteligente – Preocupado com a questão da segurança residencial, Joseph McComb, ex-estudante do curso de tecnologia em Desenvolvimento de Software do Centro Federal de Educação Tecnológica do Amazonas (Cefet-Amazonas), criou um sistema de gerenciamento remoto de aparelhos eletro-eletrônicos utilizando um assistente pessoal digital, um palm top.
Com ele, você pode viajar e, mesmo se não tiver alguém para deixar em casa, luzes serão acesas e apagadas e a música poderá ser aumentada ou diminuída, como a sinalizar a presença de um morador.
Com investimento de apenas R$ 250,00, ele pode controlar 32 aparelhos, num raio de até cem metros, apenas programando seu palm.
Ele bolou o equipamento sozinho, apenas com a ajuda de seu orientador, o professor Vicente Ferreira de Lucena Júnior, para o projeto de final do curso do Cefet-Amazonas.
INCUBADORA PREPARA EMPRESAS PARA O MERCADO
Grande parte das idéias que se tornam sucesso tiveram apoio de uma empresa como a Nynho, a incubadora de empresas do Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas (Cefet-Pelotas).
Ana Paula Matei, administradora da Nynho, levou para o estande da empresa na Globaltech, duas das cinco empresas em incubação na entidade, a Lia Raro Mídia e Educação e a Sitionet.
Enquanto a primeira, que está na Nynho há 18 meses e trabalha com produção de suportes pedagógicos (multimídia, histórias em quadrinhos, animações e jogos) e cursos de capacitação, a segunda está focada em colocar outras empresas na internet e produz soluções estratégicas para melhorar operações de vendas, marketing, suporte e serviço, por meio de portais corporativos, intranet, cd roms, multimídia e comércio eletrônico.
Ana Paula lembra dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que mostram que, de cada dez empresas criadas no Brasil, oito quebram antes de completar dois anos de vida. Já quando elas são incubadas, essa proporção se inverte e somente duas são fechadas no mesmo período de tempo.
A Nynho começou em 2000 e hoje, além da Lia Raro e da Sitionet, está ajudado a colocar no mercado a
Sistecon, que gera sistemas construtivos para a construção civil, a Incofab, que trabalha com tecnologia aplicada ao agronegócio, e a TPI, empresa que faz a integração entre sistemas e soluções de tecnologia de informação.
A administradora da Nynho conta que as empresas incubadas pagam uma taxa de R$ 7 por mês, para cobertura das despesas de infra-estrutura, como água, luz e Internet, e também de secretaria, sala para reuniões e exibição de produtos.
As empresas são selecionadas por meio de um edital, que é publicado anualmente, mas a idéia, segundo Ana Paula, é que a inscrição passe a ser contínua, durante todo o ano. Dentre os critérios para seleção de uma empresa, estão o grau de inovação tecnológica e a viabilidade técnica, econômica e comercial da idéia, além do potencial empreendedor do candidato, explica.
Incentivo – Marcelo Castro, um dos sócios da Sitionet, ao lado de Celso Dias, conta que a empresa já existia há um ano quando eles decidiram buscar a incubadora do Cefet-Pelotas, 18 meses atrás. “Os profissionais da Nynho estão nos ajudando a enfrentar o mercado com uma postura mais profissional”, diz Marcelo.
A incubadora auxilia ambos na gestão e na administração inicial do negócio e também na elaboração de projetos para financiamento por órgão de fomento. Depois que a Sitionet começou a ser incubada, eles ganharam, em 2004, uma das bolsas da Bitec, para apoio ao desenvolvimento tecnológico das micro e pequenas empresas. O prêmio é financiado pelo Instituto Euvaldo Lodi (IEL), o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), o Sebrae e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Arroz – Tâmara Nascimento e Gustavo Magalhães são estudantes do curso técnico de Eletrônica do Cefet-Pelotas e estão pensando em desenvolver seu negócio em uma incubadora de empresas. Eles estudam produzir uma máquina para medir a alvura do grão de arroz.
Segundo eles, um equipamento importado usado para esse fim custa, aos rizicultores gaúchos, cerca de US$ 5 mil. Os primeiros orçamentos feitos pela dupla mostram que o similar nacional sairá, a preço de custo, próximo a R$ 120.
Como a tecnologia é cara, muitos produtores utilizam um profissional que usa o olho como parâmetro. O problema, diz Tâmara, é que não existe um padrão de alvura e ela pretende criar um, numa segunda etapa de seu negocio. Com ele, será possível detectar quando tempo o grão de arroz precisa ser brunido na máquina para atingir entre 30% e 40% de alvura.
Com a máquina de medir a alvura, os produtores de arroz vão economizar energia, melhorar a qualidade do arroz e também diminuir o tempo de beneficiamento do grão.
T-300 – A balança que Edgar do Carmo e Tobias Soares, inventores formados em 2000 pelo Cefet-Minas, levaram para a Mostra Específica de Trabalhos e Aplicações do Cefet-Minas, também foi criada por uma empresa que ficou incubada, chamada Tecla. Quando terminaram o curso, Tobias e ficaram na Nascente, a incubadora de empresas do Cefet mineiro, por seis meses. Nesse período, eles avaliaram a viabilidade do negócio e também fizeram um plano de negócio e traçaram as estratégias de marketing.
Foi nesse tempo que perceberam que não tinham como concorrer com empresas centenárias no ramo e integraram as três funções – fatiar, pesar e imprimir – num único equipamento.
Quando os inventores adquiriram mais convicção, foram atrás de recursos para montar os primeiros protótipos. Com dinheiro do Serviço Brasileiro de Apoio as Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), eles fizeram uma versão em alumínio fundido. Descobriram que o material não permitia a repetibilidade dentro de padrões aceitáveis e trocaram o alumínio pelo aço e o plástico, com corte a laser.
Hoje, com a patente requerida junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), Tobias e Edgar correm atrás da certificação do Instituto Nacional de Metrologia, Normatização e Qualidade Industrial (Inmetro) e de um sócio capitalista, disposto a investir no invento que pode revolucionar o negócio de quem precisa encantar cada fatia de sua clientela.
Repórter:Rodrigo Farhat